sábado, 5 de janeiro de 2013

Ela s(e)m ele.

Eram mais de nove horas da noite: toca o sinal do intervalo no pátio da escola mais gelada do bairro. Como de costume, ela sempre se sentou no banco em frente a escadaria, só para ver o movimento. E ali permanecia por 15 minutos ou por uma vida inteira.
Muitas pessoas naquele pátio. Andavam; conversam; gargalhavam. Mas nada serviria para ela que ainda continuava sentada. Até que ele apareceu. Mas a ignorava como nunca, como de costume.
Aquilo duía dentro dela por quê ela nunca esperava por desprezo. Por ela ser desprezada, aprendeu a desprezar também. Não que seja uma doce vingança. É só uma doce retribuição.
As trocas de olhares eram espetáculos de circo. Ela e ele. Fingiam muito bem como ninguém que não se amavam intensamente.
Ela adoraria que aqueles 15 minutos de intervalo se dobrassem só para sentir a sensação de ser odiada e amada ao mesmo tempo por uma única pessoa. Mas não. Intactos com as palavras. Não conversavam por medo, receio ou orgulho próprio. Muito orgulho próprio.
E como sempre, ela adoraria que acontecesse o imprevisto: um esbarrão no bebedouro daquele patio lotado ou uma visita à amiga que estudava na mesma classe que ele. Mas nada!
Imprevistos meditados não aconteciam. Infelizmente.
Um turbilhão de sentimentos ela sentia ao vê-lo tão próximo, porém, não poderia tocá-lo.
Tocou o sinal. Fechou o tempo e ela ainda permanecia sentada naquele banco. Incrível!
A expetora do colégio a dirigiu até a sala de aula. Já ele... Aaah! Ele continuava disfarçando como ninguém. Os olhares descrevem sentimentos como ninguém.
Ela voltou para a sala de aula. Mas sentia que ela deveria ter feito algo para roubar a atenção daquele rapaz.
Desinquieta como sempre foi, saiu da sala de aula e foi andar no pátio. A imensidão daquele pátio dizia que ela ficaria sozinha e pensativa até chegar ao bebedouro. Em menos de dois minutos ela se sentia sozinha e pensativa. Como foi dito.
Andando como se contava os passos só para esperar o imprevisto meditado, assim aconteceu.
O tiro no escuro, por incrível que pareça, deu certo: ele descendo pelas escadas e ela voltando do bebedouro. Os dois pararam. Tentaram disfarçar, mas não conseguiram graças ao acaso. Olhares, infinitos olhares. E nenhuma palavra, e muito menos sorrisos.
Mas que vida mais louca. A falta de coragem de ambos pareciam muros de concretos, altíssimos. Fizeram de conta que não se conheciam pela milésima vez na semana só por conta de um término sem sentido.
Era a vida muito louca gritando para os quatro ventos que os dois se gostavam.
Antes que a expetora daquela escola fria a chamasse sua atenção, ela retornou para a sala de aula como se nada tivesse acontecido antes dele descer as escadas. O desprezo surgiu dali em diante. Talvez para ambos.
Ele? Ele eu não sei que rumo tomou naquele pátio daquela vida. Creio que ela não sabe também. Eles e suas vidas loucas.
E foi assim por tempo indeterminado. E será assim para sempre, a vida toda. Por quê ela e ele, se gostavam, mas para evitarem maiores decepções, fingiam que não se conheciam.
Talvez tudo isso sirva de lição para que qualquer um de vocês tenham coragem de viver e amar intensamente. Sem medo: vivam e amem!

Um comentário:

  1. É...passo por uma situação semelhante embora sem a parte do 'se ignoram e fingem que não se conhecem': ontem um casal que supostamente se amava (supostamente da parte dele, porque eu sempre tive certeza). Hoje, duas pessoas que apenas conversam num tom amigável, quase formal, totalmente diferente das constantes declarações e trocas de carinho de outrora. E cada vez que uma lembrança vem, em forma de um comentário que seja, alguém desconversa, disfarça, muda de assunto e ambos decidem que é melhor não mexer no passado e deixar como está. E o sentimento vira incógnita, ponto de interrogação...algo que ficou pra trás, quando as controvérsias, conflitos e circunstâncias da vida transformam o 'eu te amo' num 'oi, como vc tá?'

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